A ansiedade noturna é um fenômeno que muitos de nós já experimentamos. Imagine que você está prestes a dormir quando, de repente, uma preocupação surge em sua mente. Você começa a pensar nisso, imaginando mil possibilidades, tentando prever o que pode ou não acontecer. Sua mente começa a acelerar e a dar voltas em torno de si mesma, repetindo muitas e muitas vezes os mesmos cenários, plausíveis ou absurdos, num ciclo impossível de interromper. Antes que perceba, você passou a noite em claro.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), quase um bilhão de pessoas em todo o mundo sofrem de algum tipo de transtorno mental, sendo a ansiedade uma das formas patológicas mais comuns. No Brasil, mais de 26% da população recebeu um diagnóstico médico de ansiedade. Lembrando que aqui não estão inclusos os diagnósticos realizados por psicólogos em seus consultórios, logo, esse número é bem maior. Além disso, os transtornos de ansiedade são a segunda causa mais comum de afastamento do trabalho.
Os dados também mostram uma diferenciação nos casos de transtorno de ansiedade entre homens e mulheres. As mulheres apresentam uma prevalência maior de ansiedade, com 32,5%, quando comparadas aos homens (21,3%). A indústria farmacêutica tem lucrado com a venda de medicamentos para ansiedade. De fato, houve um aumento de 13% na venda de antidepressivos e estabilizadores de humor durante a pandemia.
A Ansiedade e o Medo: Uma Perspectiva Evolutiva e o Custo da Era da Superabundância
A ansiedade faz parte do ser humano desde os tempos pré-históricos. Foi crucial para a sobrevivência, pois permitia que nossos ancestrais antecipassem perigos e tomassem medidas para se proteger. Hoje, a ansiedade é transferida para novas preocupações, e os medos se tornaram outros.
A ansiedade e o medo estão interligados, pois ambos são acionados por uma ameaça. No entanto, eles diferem na maneira como são acionados na pessoa e como reagem no corpo. Não é possível sentir medo sem sentir ansiedade, pois a pessoa começa a processar as consequências futuras a partir do estímulo do medo.
A vida nas cidades tem manifestado um lado negativo que não estamos preparados. Algumas das possíveis causas do aumento da ansiedade nas grandes cidades incluem redes familiares menos estruturadas, abusos na infância, maior exposição à violência, uso de substâncias psicoativas e o alto custo de vida, entre outras.
Vivemos em uma era de superabundância. Nunca antes tivemos tantas opções à nossa disposição, seja para assistir um filme, escolhemos primeiro qual dos vários streamings para depois passar tempos escolhendo o filme, diversos aplicativos de redes sociais e vários sites e aplicativos de compra. No entanto, essa grande oferta tem um custo: a ansiedade. O preço de fazer uma escolha é abrir mão de todas as outras alternativas. Esse fenômeno, conhecido como o custo da oportunidade, pode levar a um aumento da ansiedade. E para compreender os efeitos nocivos do abuso das redes sociais e dicas de como reduzir o uso, clique aqui.
Além disso, o excesso de informação a que estamos expostos acelerou a velocidade com que construímos nossos pensamentos. Estamos constantemente bombardeados com novas informações, o que pode sobrecarregar nossa capacidade de processamento e contribuir para o aumento da ansiedade.
O Papel do Cérebro na Ansiedade
A ansiedade envolve várias regiões cerebrais, sendo um processo complexo que inclui interações entre diferentes áreas. Algumas das regiões cerebrais associadas à ansiedade incluem:
O córtex pré-frontal, tem um papel importante no planejamento de comportamentos cognitivamente complexos e na expressão da personalidade.
O córtex cingulado anterior, responsável por orquestra as emoções e processos cognitivos, desempenhando um papel vital na regulação emocional, tomada de decisões e controle de impulso.
A amígdala, crucial para processar emoções, especialmente o medo, e desempenha um papel importante na memória emocional.
Hipotálamo: Influencia a resposta do sistema nervoso autônomo e a liberação de hormônios do estresse.
Hipocampo: Importante para a formação e recuperação de memórias, especialmente aquelas relacionadas a eventos estressantes.
Essas regiões não operam isoladamente; interagem em redes complexas para modular a experiência da ansiedade.
Como a Ansiedade Age no Corpo e na Mente
A ansiedade manifesta-se de várias maneiras no corpo e na mente:
Hipervigilância: A pessoa fica hipersensível a riscos, reais ou imaginários, devido à hiperatividade na amígdala.
Incapacidade de relaxar: O córtex pré-frontal, responsável pela consciência, não informa à amígdala que um determinado estímulo deixou de representar uma ameaça, e ela continua a estimular um comportamento defensivo.
Comportamento de fuga: Fugir de uma ameaça é uma forma de se proteger, mas na crise de ansiedade, a pessoa continua temendo a ameaça, mesmo que ela esteja distante.
Intolerância à incerteza: Pessoas ansiosas têm dificuldade em tolerar a incerteza, principalmente quando envolve algum risco.
Supervalorização da ameaça: Ansiosos exageram a probabilidade de que aconteça algo ruim e suas possíveis consequências, gerando o estresse antecipatório.
Controle mal adaptativo diante de ameaças: O controle sobre o comportamento e a cognição fica prejudicado.
A ansiedade não é apenas uma experiência mental ou emocional. Ela também pode causar uma série de sintomas físicos, que podem incluir:
- Palpitações cardíacas
- Falta de ar
- Tontura
- Suor excessivo
- Problemas gastrointestinais
Esses sintomas podem ser muito desconfortáveis e podem contribuir para o ciclo de ansiedade, pois a pessoa pode começar a se preocupar com esses sintomas físicos, o que pode aumentar a ansiedade.
A Importância da Psicoterapia
A ansiedade pode ter um impacto significativo na qualidade de vida de uma pessoa. Ela pode afetar o desempenho no trabalho, os relacionamentos e o bem-estar geral. Pessoas com ansiedade podem ter dificuldade em realizar tarefas diárias, podem evitar situações sociais e podem experimentar um sofrimento emocional significativo.
A psicoterapia desempenha um papel crucial no tratamento da ansiedade. A ansiedade é uma adaptação evolutiva que permanecerá em nossos genes, independentemente da prosperidade e da segurança da sociedade em que vivemos. Ela continuará a nos ajudar a sobreviver, identificando ameaças reais ou imaginárias.
A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é uma forma eficaz de psicoterapia que pode ajudar as pessoas a entender e gerenciar suas reações de ansiedade. A TCC oferece ferramentas para ajudar as pessoas a mudar padrões de pensamento negativos e comportamentos autodestrutivos, permitindo-lhes viver de maneira mais tranquila e equilibrada.
Além disso, acho importante destacar que a ansiedade não é apenas um problema individual, mas também um problema social e cultural. As pressões da vida moderna, o ritmo acelerado das cidades e a constante exposição às redes sociais podem contribuir para o aumento da ansiedade. Portanto, além do tratamento individual, também precisamos considerar estratégias coletivas e políticas públicas para criar ambientes mais saudáveis e menos ansiosos.